quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

A grande mentira do Natal

Dentro do mesmo aspecto religioso citado, o Natal não é uma unanimidade cristã. A data tem origem controversa e é alvo de polêmicas. Além de não existirem registros confirmatórios, existem indicações contrárias de que Jesus tenha realmente nascido no dia 25 de Dezembro. Porém, opostamente ao argumento de que o Natal seja uma festa pagã dissimulada, é mais sensato admitir que a data tenha sido determinada como parte da estratégia de instauração do cristianismo como religião oficial do estado romano. Com a finalidade de redirecionar cultos dedicados às divindades pagãs, a festividade natalina foi sobreposta ao período em que eram realizadas as solenidades correspondentes à Saturnália e a Brumália. Se ao invés de substituí-las, o Natal acabou por assimilar muitas de suas práticas a ponto de ser totalmente envolvido por elas, já é outra conversa.

As Saturnálias eram oferecidas a Saturno, deus romano da agricultura que equivale ao deus Cronos da mitologia grega, reitor do tempo. De fato, o plantio está atado ao fator tempo e Saturno era considerado um deus rigoroso, porém justo. Ele premiava com a realização dos desejos, todos aqueles que se esforçavam com constância e persistência para atingir suas metas. Isto implica no mesmo tipo de gratificação pelo mérito relacionado à figura do papai-noel. Papai-noel, supostamente, julga e presenteia aqueles que persistam em agir bem durante o ano, adotando a mesma premiação em função do tempo que mitológica e astrologicamente é regido por Saturno. Diga-se de passagem, Saturno também representa a velhice e até nisso revela identidade com o velho Noel.

No estudo da Astrologia, ele é muitas vezes chamado de "O Senhor do Carma" por ser encarregado de julgar as ações dos homens, cobrando suas dívidas e dando a cada um, segundo suas obras. Ele rege os caminhos pedregosos, as rochas e as montanhas. De tal forma, Saturno representaria os obstáculos ou os desafios que devem ser superados no processo evolutivo de cada ser humano. Simbolicamente, remete à ideia maçônica de lapidação da pedra bruta pela qual o homem deve passar, mediante várias provas, antes de atingir a plenitude da sua existência.
Conforme veremos mais adiante, os anéis que circundam o planeta servem ainda de iconografia fálica para cultos e praticas de magia sexual. Além de seu formato sugestivo, o planeta possui conexões estabelecidas com o libidinoso deus Pã que é um dos mitos de Capricórnio, signo que está sob a regência de Saturno.

Na prática, o lema de "saber para prever e prever para prover", promovido pela escola positivista de August Comte, é muito mais antigo do que se possa imaginar à primeira vista. Desde os primórdios de sua história, as civilizações têm buscado formas de antecipar as contingências dos ciclos de fenômenos naturais, visando reduzir ou administrar o impacto sobre suas existências. Uma dessas ferramentas é a Astrologia que tem origem na observação astronômica e na busca de relações entre os fenômenos celestes e terrestres.

Alguns talvez não saibam, mas os sistemas de contagem de tempo obedecem a referenciais astronômicos. Dependendo da cultura em enfoque, o principal protagonista do calendário utilizado é o Sol. Por tal fato, é importante ter em mente que o inverno no hemisfério norte e o verão no hemisfério sul correspondem ao momento da entrada do Sol no signo de Capricórnio, pertencente ao elemento terra que, dos quatro elementos, é o mais ligado à satisfação dos sentidos físicos e aos apelos do mundo material.

Conforme já dito, o planeta Saturno é o regente de Capricórnio e notamos assim, uma relação entre Capricórnio, Saturno e o Sol atuando astrofisicamente por trás dos cultos e celebrações da época.
Sob um olhar mais atento, veremos que os folguedos pagãos ainda persistem, em comportamentos onde as pessoas praticam excessos e se fixam apenas no recebimento de presentes ou em mesas fartas, regadas à bebida abundante. Constatação que não é feita para condenar a celebração do Natal, em si, mas para levantar uma profunda reflexão sobre quem, de fato, estaria sendo homenageado ou o quê realmente estaria sendo comemorado nessa ocasião. Essa identificação depende de uma sincera análise das intenções, atitudes e consciência de cada um em relação à data.

Muitos opositores do Natal afirmam que o grande homenageado nessa época é Ninrode.

Na Bíblia, o nome de Ninrode é assim citado:

"Os filhos de Cão: Cuche, Mizraim, Pute e Canaã. Os filhos de Cuche: Seba, Havilá, Sabtá, Raamá e Sabtecá; e os filhos de Raamá são Sebá e Dedã. Cuche também gerou a Ninrode, o qual foi o primeiro a ser poderoso na terra. Ele era poderoso caçador diante do Senhor; pelo que se diz: Como Ninrode, poderoso caçador diante do Senhor. O princípio do seu reino foi Babel, Ereque, Acade e Calné, na terra de Sinar. Desta mesma terra saiu ele para a Assíria e edificou Nínive, Reobote-Ir, Calá, e Résem entre Nínive e Calá (esta é a grande cidade)." Gênesis 10: 6-12

A idéia de construir uma cidade e uma torre que alcançasse céu é reputada a Ninrode; empreendimento que resultou na confusão de diferentes línguas e corresponde à famosa história da torre de Babel, segundo Gênesis 11: 1-9.
De acordo com alguns escritos, Ninrode era tão devasso que tomou a sua própria mãe, Semíramis, em casamento. Dessa união, logo após a morte de Ninrode, nasce Tammuz, em 25 de Dezembro. Além de filho-irmão, foi dito que Tammuz seria ninguém menos do que Ninrode reencarnado.

Na realidade, o que impressiona nessa história é a desenvoltura para converter em herói, alguém que se destacou na rebeldia contra Deus. Um homem que imitou as atitudes do Anjo Caído e personificou os extremos da ganância pelo poder. Sem dúvida, um grande construtor e nesse ramo, um modelo para aqueles que o consideram como o primeiro maçom da história da humanidade pós-diluviana. De tal forma, Ninrode foi eternizado através de uma identificação com fenômenos naturais relacionados aos ciclos da luz solar.

As religiões pagãs estão intimamente ligadas aos ritmos da natureza e, nesse aspecto, não são boas nem más, convergindo para uma tentativa de harmonização entre o homem e o meio ambiente. O Mal consiste no endeusamento de tais fenômenos, na manipulação devocional e no estabelecimento de mistérios que somente sacralizam o intuito de concentrar o poder de muitos nas mãos de poucos.

Ninrode, Semíramis e Tamuz, na verdade, são figuras bem menos importantes pela existência mundana que tiveram ou pelos atos que tenham praticado do que pelos princípios que eles mitificam.

Acima de qualquer condenação moral, a implicação de Ninrode ter desposado a própria mãe possui um significado maior do que a decadente perversidade de uma relação incestuosa. É preciso ver Semíramis através de uma perspectiva mais ampla, pois ela foi e é usada para representar a própria mãe natureza, fonte de toda a vida terrena. Tendo essa premissa em mente, lembremos Lavoisier que disse:

"Na natureza, nada se perde, nada se cria, tudo se transforma."

A natureza recicla continuamente a sua própria criação e o casamento de Ninrode e Semíramis, mãe e filho, ilustra esse mesmo processo indissolúvel. Ninrode representa a morte no sentido de um adormecimento ou latência necessária das forças da natureza no advento do inverno. Conforme nos aproximamos dessa estação, além da queda de temperatura, as noites se alongam, os dias encurtam e a vida se recolhe em si mesma.

O Sol parece menor ou mais distante até alcançar a sua inclinação máxima, envolvendo a Terra nas trevas da noite mais longa do ano, quando entra no signo de Capricórnio e inaugura o inverno para quem vive no hemisfério norte do planeta. Mas, em torno do dia 25 de Dezembro, o Sol parece retornar, aumentando gradativamente o calor e a intensidade da luz que irradia. Com ele, ressurge a vida. Tal fenômeno ficou conhecido na antiguidade como “Natalis Solis Invictus” (Nascimento do Sol Invencível).
Simbolicamente, Ninrode morre nos braços de Semíramis, que o recria através de Tamuz (diminuto sol invernal ou deus-menino), filho, irmão e reencarnação de Ninrode. Na religiosidade pagã, trata-se da consumação de um ciclo para o início de outro, dando continuidade à vida. Outras culturas utilizam mitos relativamente similares para essa mesma representação, como é o caso de Osíris, Ísis e Hórus.

"Assim como é acima, também é abaixo", diz o aforismo hermético de correspondência. Na Terra, Semíramis personifica a natureza que recicla e revitaliza a fauna e a flora. No céu ela é o próprio espaço. É a rainha celestial em cujo ventre ou manto estrelado trafega o Sol, em seu percurso pelo Universo. Notem como aquilo que é natural e pertence à ordem do mundo fenomênico passa a adquirir contornos de religiosidade mística.

O leitor deve reter na memória que, para quem vive no hemisfério norte, o palco desses acontecimentos cósmicos e suas repercussões terrestres é o signo de Capricórnio, regido por Saturno. Saturno era o deus da abundância, resultante das boas colheitas que trazem os frutos de um trabalho consistente. O seu nome deriva do latim "satur", mesma raiz de saturar, no sentido de fartar-se, de nutrir-se ou encher-se ao máximo. De fato, dentro da Astrologia, uma das características de Saturno é justamente a de estabelecer o ponto de saturação correspondente aos limites de cada ser humano.
 
O seu símbolo gráfico é formado pelo semicírculo (alma) que sustenta a cruz (matéria), pois Saturno representa o conjunto de deveres e obrigações que pesa sobre cada alma, enquanto ocupar o invólucro material. Fardo sentenciado na Bíblia:

"Do suor do teu rosto comerás o teu pão, até que tornes à terra, porque dela foste tomado; porquanto és pó, e ao pó tornarás." Gênesis 3: 19
A fábula da cigarra e da formiga ilustra essa ideia de que aquele que trabalha com afinco, conquista o direito de usufruir o produto do seu esforço. Inversamente, tratando-se de uma comemoração, as Saturnálias saudavam Saturno através de um comportamento libertário (e libertino) que traduzia o rompimento temporário desses limites. Elas representavam momentos de alívio para as restrições do aspecto disciplinador de Saturno, atuando como uma catarse social, semelhante às festas carnavalescas. A quebra aparente e provisória de barreiras, somada ao nivelamento de privilégios festivos entre as diferentes classes do império, servia para abrandar parte da pressão originária das desigualdades existentes entre o povo e a elite dominante.

Em grande parte do continente europeu, a segunda metade do mês de Dezembro reunia condições adequadas para essas celebrações. O abate de parte dos rebanhos sobrevinha da necessidade econômica de poupar gastos com alimentação, diante da redução dos pastos. Para muitos, esse era o único período do ano onde era garantida a presença de carne nas refeições, complementando a dieta para melhor suportar os rigores do inverno. Adicionalmente, o vinho e a cerveja atingiam a maturidade do seu ponto de fermentação para o consumo.

Assim sendo, a eclosão de tais eventos contribuía para um clima de festa que propiciava exageros à mesa.

Saturno e Capricórnio presidem as questões de hierarquia e status social. Durante as Saturnálias, permitia-se uma quebra dessa estratificação que separa os indivíduos em classes distintas, com privilégios e poderes diferenciados. Nas Saturnálias, brincava-se com uma inversão de papéis, onde o senhor podia se passar por escravo e o escravo encenar o papel de senhor. Comida, bebida, sexo e troca de presentes era a tônica de tais celebrações e o leitor já deve ter percebido que tais comportamentos não estão perdidos em um passado remoto.

Usemos como exemplo o meio corporativo, onde, claramente, perduram algumas das tradições e excessos cometidos durante as Saturnálias, através dos eventos de confraternização de final de ano. Tais confraternizações, geralmente, reúnem funcionários de todos os departamentos e escalões que, em muitos casos, podem dividir as mesmas mesas, independente de qualquer diferença hierárquica.
Descontraidamente, dançam, comem e bebem juntos, no pressuposto de uma unidade familiar ou fraternal, baseada em interesses comuns. Conforme avançam ao som da música, bebedeira e comilança podem, inclusive, estender esse envolvimento para etapas que se desenrolam além dos limites visíveis de onde tais comemorações acontecem...

São realizados sorteios onde todos, indistintamente, podem ser premiados por seus serviços à empresa. Além disso, é comum que haja a entrega de presentes do assim chamado "amigo oculto" ou secreto. Essa brincadeira também abre a possibilidade de um inter-relacionamento entre diferentes níveis hierárquicos, onde chefes presenteiam funcionários e funcionários presenteiam chefes, minimizando suas diferenças e aplacando desentendimentos pessoais. De tal modo, esses momentos servem como válvula de escape para despressurizar as tensões entre o mando e a obediência.

É importante ressaltar que, em nossos tempos modernos, impera muito mais uma espécie de ceticismo materialista do que qualquer tipo de rendição de graças a deuses pagãos. O simbolismo está presente, mas a grande maioria das pessoas não faz qualquer relação intencional ou realiza ritos voluntários e conscientes.

Quem celebra o Natal em função da satisfação carnal ou material, não celebra Jesus Cristo. Mas quem o faz em memória do seu nascimento, reaviva o amor de sua presença entre nós e aproveita a receptividade da época para proclamar o seu nascimento, ainda que a data não possua comprovação real e tenha sido escolhida por critérios políticos.

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